Com menos decoreba, Enem exige mudanças nos cursinhos
Desde o seu surgimento, em meados dos anos 1950, o cursinho pré-vestibular tem ocupado um espaço permanente no currículo de muitos estudantes do ensino médio. Mas seu modelo atual pode estar com os dias contados à medida que mais universidades passam a aceitar o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) como seu principal processo seletivo.
O Enem cobra uma lista menor de conteúdos do que os vestibulares realizados no País, menor até mesmo que os programas municipais de ensino médio. "O problema é que muitos cursinhos não entenderam isso. Eles ainda ministram aulas com conteúdos de vestibular, e acabam ensinando mais do que é exigido no Enem", comenta o presidente de honra do Henfil, cursinho especializado em Enem, Mateus Prado.
Criado para avaliar o processo de aprendizagem do aluno ao longo do ensino médio e verificar a qualidade da educação ofertada no País, o exame pretende cobrar menos memorização de conteúdo e fórmulas e mais raciocínio lógico. Mas é possível ensinar tais competências? Na opinião de Prado, "não tem como ensinar a pensar, mas é possível abordar os assuntos do Enem em cursinhos preparatórios. O problema é que muitos cursinhos só trocam a capa da apostila, e escrevem "pré-enem" no lugar de "pré-vestibular"".
Contudo, para a psicóloga da consultoria educacional Diálogo, Carmen Bragança, o Enem não é a única prova a demandar habilidades cognitivas do candidato. Ela acredita ser equivocada a visão de que a prova do Enem e a dos vestibulares tradicionais sejam antagônicas, mas, em sua opinião, o Enem, mesmo com suas deficiências, avalia melhor o aluno. "A tendência é a abolição dos cursinhos, enquanto isso, eles devem manter seu objetivo original, mas adequarem-se no sentido de promoverem um processo de aprendizagem por competências. A grande questão é: estão os educadores e gestores de educação preparados para operacionalizar um processo de aprendizagem por competências? Tudo indica que nem no nível superior esse objetivo é plenamente alcançado", diz.
Independentemente do processo seletivo que venha a ser predominante no País, é inegável que todas as formas de aprendizagem precisam se ajustar. E isso inclui todo o planejamento das provas. Segundo Carmen, "a avaliação do Enem poderia ser realizada por amostragem, desde que consistente teórica e tecnicamente, com um investimento muito menor, com melhor gestão de risco e com resultados assertivos e eficazes para estabelecer estratégias de melhoria de qualidade do ensino médio em todo País".
Embora o Enem tenha recebido a adesão de universidades tradicionais, como a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e a Universidade Federal de Viçosa (UFV), o vestibular ainda é a principal forma de ingresso em Estados como São Paulo e Rio Grande do Sul. Mesmo que o cenário se invertesse, para alguns professores de pré-vestibular, não seria motivo para fechar os cursinhos.
"Não creio que os cursos pré-vestibulares desaparecerão, tanto no curto como no longo prazo. Eles são muito versáteis e criativos. Por esta razão certamente eles apresentarão uma nova fórmula de contemplar o novo estilo de seleção, tanto em termos de material didático quanto em dinâmica de sala de aula", afirma o professor de história do cursinho pré-vestibular Decisivo, Sérgio Freitas.
Para uma adaptação mais completa, cursinhos reclamam da falta de material e orientação para a prova do Enem. Contudo, o Ministério da Educação (MEC) disponibiliza todas as provas do Enem já apresentadas até o momento (duas em 2009, quando a primeira prova vazou, e duas em 2010, quando foi realizado um exame extra para quem estava nos presídios), num total de 760 questões, além de simulados.
Se os cursinhos produzem material didático próprio com conteúdo de vestibular tradicional, não se arriscam a fazer o mesmo com perguntas específicas para o Enem. Prado ressalta que o MEC até disponibiliza um guia com algumas diretrizes como "você não pode colocar uma alternativa que cancele a outra, as alternativas não podem ser absurdas e as questões devem julgar se o aluno sabe tal assunto", mas, segundo ele, quase nenhum cursinho atenta para esses diferenciais.
Fonte: Terra
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